20060328

coisas da juventude

"as mudanças nunca ocorrem sem inconvenientes, até mesmo do pior para o melhor." [Richard Hooker]
toda e qualquer mudança é, por natureza, encarada sempre com muito cepticismo. é nos difícil enfrentar o desconhecido, abdicando de um equílibrio que conhecemos e que, mesmo não sendo o ideal, sempre nos transmite alguma segurança, seja ela falsa ou não.

vem isto a propósito das recentes manifestações, e consequentes confrontos, em França contra o denominado Contrato de Primeiro Emprego (CPE). concorde-se ou não, o facto insofismável é que a juventude francesa sempre se mostrou muito mais reivindicativa e determinada na exigência dos seus direitos sociais do que qualquer outra de um outro qualquer país europeu. quem não se recorda ou, pelo menos, já não ouviu falar do famoso Maio de 68 e as suas consequências?

isto eu invejo dos franceses: esta capacidade de se mostrarem revoltados, de se mostrarem insatisfeitos, de tornarem público, com mais ou menos excessos, o que lhes vai na alma [e na carteira]. em certa medida, começo a ficar farto deste nosso país de brandos costumes...

ouvi o Miguel Sousa Tavares dizer a propósito que as actuais manifestações em França eram de uma juventude sem causas. não consigo deixar de discordar e questionar se estas manifestações, em tão grande escala, não serão mais de uma juventude, cada vez mais consciente, de que o seu futuro não será tão sorridente como um dia sonharam [ou os fizeram sonhar].

20060327

um dia de teatro

"o teatro comove, ilumina, incomoda, perturba, exalta, revela, provoca, transgride. é uma conversa partilhada com a sociedade. o teatro é a primeira das artes que se confronta com o nada, as sombras e o silêncio para que surjam a palavra, o movimento, as luzes e a vida."
as palavras são do dramaturgo Víctor Hugo Rascón-Banda e as verdades são de todos os que amam o teatro. de todos os que fazem deste dia um dia tão importante nas suas vidas como todos os outros em que, na plateia ou no palco, nos fazem sonhar.
hoje, porque é o dia mundial do teatro, espalham-se cores e palavras por inúmeros palcos do país. e eu, como não podia deixar de ser, também vou ao teatro. e vocês vão ficar em casa?

dia mundial do teatro

porque hoje é o dia de todos os que se entregam, sem medos e sem preconceitos, a essa arte maior, não podemos deixar de reflectir na mensagem internacional do dia mundial do teatro 2006, da autoria do dramaturgo mexicano Víctor Hugo Rascón-Banda. para ler no [teatro das palavras].

20060323

alma de gato

um dia li, descobri, disseram-me, não sei bem, o facto é que, desde essa data, aprendi que um gato nunca aprende com um seu congénere. isto é, estejam dois gatos diante de um lago de água a ferver e se um deles, provavelmente o mais aventureiro, se fizer à água e sair dela todo queimado, isso não impedirá o outro de, no momento exactamente a seguir, fazer o mesmo. isto porque um não aprende com o erro do outro. os gatos têm que sentir a dor por si mesmos para não voltarem a repetir.
nós, gente que se diz humana, temos também esta alma de gato. raramente aprendemos com os erros dos outros. temos essa necessidade de abrir a ferida, senti-la doer para então, depois, sabermos o que custa. sofremos desta alma de gato que, violentamente, nos ensina a palavra viver.

20060322

os números

estamos na era dos números.
meus senhores, tudo o que sabe e se sonha são números: os critérios são números, as mortes são números, os casamentos e os divórcios são números e as vidas das pessoas são números. hoje em dia mais importante que o nome [o nosso nome, a nossa identidade] é o número. o número em que nos classificamos, a percentagem em que estamos inseridos, o número que temos e que, sem darmos por isso, já não temos mas somos. como nas filas da segurança social ou do talho, como nas percentagens do instituto nacional de estatística, como no euromilhões: o que interessa são os números.
porque um nome tem sempre um rosto. um número, por sua vez, é capaz de ocultar o rosto e a alma. e sem rosto e sem alma não há sofrimento, dizem eles. e nós acreditamos com a mesma facilidade com que dizemos que dois mais dois são quatro.

20060321

vida de blog

isto dos blogs tem tanto de vício como de efémero. o vício faz-nos dormir com a sensação de que podíamos ter dito mais qualquer coisa, o que, na manhã seguinte, será obrigatoriamente compensado com mais dois ou três posts. é sempre assim: no início das coisas há sempre mais tesão. assim sem mais [foi um amigo, escritor diga-se, que me ensinou que não devíamos ter medo das palavras].
mas depois a rotina das palavras, dos dias e dos assuntos levam sempre ao fim certo. os dias dão-nos novas conquistas, novos desafios e a dita coisa empertiga-se para outros lados. pois é, diria o meu amigo escritor, é a vida. mesmo que seja a de um blog.
afinal, sendo o blog o reflexo do homem [ou da mulher] nem outra coisa seria de esperar.

20060318

compras

compreendo as rotinas dos que são obrigados a ocupar o seu fim-de-semana com as compras nos hipermercados. é vê-los, a eles, a elas, a eles, elas e as crianças, todos juntos, em comunhão ou separados, na azáfama dos preços e dos sacos de plástico. é a missa mais urbana que há.
mas o sol não se compadece com rituais consumistas e eu prefiro terminar os dias da semana fechado, entre estantes e embalagens, do que dispensar os meus sábados e domingos de um bom passeio na avenida.
quem quiser que reze. as catedrais estão lá para isso.

20060317

índigo

aí está uma cor e uma voz que, de tão doces, resolvi espalhar por toda a casa. o novo trabalho de Susana Félix, o anil, a cor azul, o índigo é um hino às suaves melodias, com dez temas de indiscutível alma.
para ouvir nos braços de quem se ama. sem medo das horas.

a fotografia

não resisto ao olhar de um bom fotógrafo. as suas fotografias podem ser filmes completos gravados numa só imagem. são a sinopse de toda uma alma, despida para a objectiva. são uma sublime forma de arte.
o meu tributo a todos esses olhares. tão mágicos como aquele que, não sei bem como, encontrei, à espera, num dia de sol, por entre o arvoredo da serra virgem. para confirmar no teatro das palavras.

20060316

nota negativa

a frase é de José Sócrates, primeiro-ministro de Portugal, na análise que faz do seu primeiro ano de governação: «do ano que passou há uma coisa que ninguém diz que é que ficou tudo na mesma»
o que é bem verdade, digo eu. agora fica à consciência de cada um saber se as mudanças foram para melhor ou para pior.
no que me toca, e depois de saber - entre muitas outras aberrações e algumas [poucas] boas novidades - de que os meus filhos irão ter que nascer em Coimbra ou em Leiria, na sequência do anunciado encerramento da maternidade do Hospital da Figueira, a minha avaliação não podia, infelizmente, estar mais facilitada. para pior.
alguém é capaz de explicar ao Socras e ao seu Ministro da Saúde como é fazer mais de cinquenta quilómetros com dores de parto? é que eu acredito que eles não saibam...

20060315

o factor C

o que é que se escreve num blog quando não há nada que valha a pena dizer? ainda pensei em prometer qualquer coisa, mas lembrei-me de que sou um desempregado político. crónico, diga-se. ainda tenho esperança de um dia poder vir a ser bafejado pelo factor C. só tenho que arranjar um bom repelente de princípios e convencer a minha mãe de que a política tem as suas vantagens.

20060314

sabichões

os sabichões são um bicho comum no nosso dia-a-dia. para além de saberem de tudo e, muitas vezes, até mais do que os especialistas da matéria em causa - e, note-se, seja ela qual for - são capazes de, em segundos, opinar com rigor de mestre, desmentindo tudo e todos. uma espécie de donos da verdade, comprada em saldos.
"aquele pensa que sabe muito, mas não sabe de nada, e a sua ignorância é tanta que nem sequer está em condições de saber aquilo que lhe falta." [François Fénelon]
eu confesso: estes seres provocam-me urticária. será que a humildade está assim tão cara?

20060313

é bem possível

a palavra ''impossível'' é uma expressão infeliz; nada se pode esperar daqueles que a usam frequentemente. [Carlyle, Thomas]

em jejum

pequenas complicações de ordem gastrointestinal, levaram a minha médica de família a prescrever-me uma simples ecografia abdominal. despreocupado, dirijo-me à clínica indicada para o efeito e procedo à marcação do exame. até aqui nada de anormal, não fosse eu ter, no final do processo, dado de caras com a data e a hora do exame: 22 de março, às 12h10, em jejum. nem mais, em jejum até à hora do almoço!
porque não dizem àqueles senhores que o pequeno almoço é a refeição mais importante do dia e que, outro pormenor importante, eu entro ao serviço às 9 horas. estou a tentar mentalizar-me de que terei que passar toda a manhã sem comer absolutamente nada. enfim... uma coisa vos garanto, é mais provável morrer da cura do que da doença.

20060312

fins-de-semana

eu desconfio que as 48 horas de cada fim-de-semana andam, discretamente, a ser adulteradas. pode até ser uma ideia promíscua, mas a minha relação extramente afectiva com estes dois dias anda, ultimamente, a sofrer de sérios problemas disfuncionais. é como uma relação sexual com problemas de ejaculação precoce - é tudo tão bom, mas dura tão pouco...

sun-day

saem as gentes das tocas frias para se passear ao sol. os passeios fervilham de cor e nas estradas o passo é de caracol. os jardins vibram, os pássaros cantam na serra melodias de encantar e nós de mãos quentes e alma cheia pedimos um ice tea na esplanada virada ao mar. e depois cantamos.
"eu gosto é do Verão, de passearmos de prancha na mão, saltarmos e rirmos na praia, de nadar e apanhar um escaldão / e ao fim do dia, bem abraçados, a ver o pôr-do-sol, patrocinado por uma bebida qualquer" [Fúria do Açúcar]

20060311

mulheres

o dia da mulher [8 de Março] já lá vai, mas um grupo de amigas resolveu comemorá-lo hoje. juntam-se à volta da mesma mesa mais de 65 mulheres e eu tive a sorte [ou o azar] de ter sido um dos eleitos para as servir.
confesso que estou curioso de saber se me espera o paraíso ou o inferno.

360 graus

encontro percursos e dias que deslizam simplesmente. o vento leva-os. eu não gosto de ser levado, gosto bem mais de levar. por isso, sou a favor das mudanças. acredito até que há circunstâncias em que só o radicalismo pode gerar soluções. sou adepto das voltas de 360 graus.
mas - como em tudo na vida, há sempre um mas - tenho para mim que o ser-se radical é como beber um copo de vinho: faz bem há saúde, desde que não se abuse.

nado

"a vida humana não tem só um nascimento, só uma infância, é feita de vários renascimentos, de várias infâncias" [Alberoni , Francesco]

sou como uma criança mimada. e de vez em quando apetece-me recomeçar.

do teatro

a estreia.